terça-feira, 25 de setembro de 2012

O espaço em branco

     Na sarjeta. Fudido. Lascado. Chorando por algo ou alguém. Drogado. Embriagado. Na fossa. Na merda. Na sarjeta.
     A sarjeta (segunda Scott McCloud) é o espaço entre dois quadros que permite ao leitor o papel de cúmplice da história e do autor. Espaço onde ele pode parar pela quantidade de tempo que lhe for interessante e submergir em todo pensamento cabível ou não dentro daquela obra em suas mãos. Espaço em que se pode completar o movimento de uma ação, passar de um cômodo a outro, viajar entre dois planetas, lembrar-se de uma noite com sua namorada, de um filme que viu, de outro quadrinho que leu, se ligar que acabou de ler um quadro muito ruim ou se deparar com a beleza de uma nova utilização dos elementos da forma a qual ele dedica seus estudos. Pode ser o espaço que ele utiliza para anotar suas observações acerca daquela obra ou um espaço que o inspire a fazer outra história em quadrinho.
     O pensar pode ser atrelado ao ato de criticar. Ato que normalmente não é muito bem recebido pelos autores, mestres ou estrelas das artes. O crítico junto ao consumidor e ao realizador formam uma tríplice força importante para o crescimento qualitativo de qualquer arte. Porem no universo quadrinhístico brasileiro o coeficiente de crítica é escasso. Pode ser estupidez afirmar algo assim, mas os únicos espaços existentes que comentam (não pensam ou criticam) quadrinhos são destinados a noticias e spoilers. Isso parece crítica. Não é pensar a forma. Não contribui para o desenvolvimento das historias em quadrinhos no Brasil. Serve basicamente para um mercado de bancas e colecionadores que não aguentam esperar pela próxima saga. Não que não devamos fazer isso, mas não devemos nos limitar somente ao ato de decorar toda a vida impressa de Wolwerine e anteceder o que virá, mas também pensar em como estão fazendo ele ou como poderiam fazer. Não é fácil assumir o papel da crítica. Assim como o autor, o crítico expõe suas ideias, se posiciona e espera por concordâncias e discordâncias. O crítico pode ser visto como um agente incentivador do pensar. O cara que coloca fogo em discussões. Mas normalmente é visto como um pedante idiota mal amado, o que de fato realmente pode ser o caso em algum momento de sua vida.
     Começar a refletir porque nos quadrinhos um das principais formas de pensar recebe um nome tão pejorativo pode começar a desenhar um panorama da situação. Se criticar é pensar, e pensar é estar na sarjeta então poeticamente já começamos bem. Mas e os quadrinhos?
     Na Sarjeta é um espaço desenvolvido para os mal amados do mundo dos quadrinhos. Espaço virtual destinado a se pensar enquanto muitos só desejam sentir ou colecionar. Espaço para os que trabalham ou pretendem trabalhar com essa linguagem. Espaço para dividir problemas e arrumar soluções.

 Ian Abé